A resposta à pergunta “Vale a pena comprar um imóvel no exterior?” é, obviamente, depende. Além disso, quando digo exterior me refiro aos EUA. Apesar do interesse em Portugal ter crescido muito ultimamente, não tenho conhecimento de como as coisas funcionam por lá e não vou dar opinião sobre o assunto (evitando o efeito Dunning-Kruger).
A crise econômica no Brasil levou muita gente a procurar alternativas de investimento nos últimos anos. A recuperação do mercado imobiliários nos EUA, principalmente da Flórida, aumentou o interesse dos brasileiros em ter um pedaço de terra por lá. Diversos lançamentos foram feitos voltados a brasileiros com material publicitário em português, pessoas famosas fazendo propaganda e preços relativamente atrativos. Isso fez com que muita gente sonhasse com diversas idas à Disney (sem lembrar que o ingresso é mais de USD 100 por pessoa!).
Entretanto, existem uma série de fatores que devem ser levados em consideração para tomar esse tipo de decisão (lista não exaustiva):
- o imóvel é para investir, para usar ou ambos?
- o imóvel está pronto ou será construído
- vai ser financiado ou a vista?
- se for financiado, qual o percentual?
- qual estruturada será utilizada (uma empresa nos EUA, uma empresa offshore…)?
- quem serão os prestadores de serviços?
Além disso, o preço do imóvel está longe de ser o custo final do imóvel (o que acaba surpreendendo muita gente). Por exemplo, assim como no Brasil, comprar e vender um imóvel nos EUA custa caro: 6% de comissão (paga sempre pelo vendedor). Outros custos que pouca gente lembra (e dependerá da estrutura escolhida):
- contador e as taxas da empresa nos EUA
- taxas da empresa offshore que será dona da empresa nos EUA
- seguro, property tax (o equivalente ao IPTU)
- HOA (condomínio)
- reparos
HUD
Um documento importante nas transações imobiliárias dos EUA é o HUD. O nome vem do item A da imagem abaixo (que é o HUD!): Housing and Urban Development.
Depois dos dados de cada parte e do imóvel, temos duas colunas. A J, mostra os custos do comprador e a K do vendedor. Nas linhas 101 e 401 entra o preço acoordado pelo imóvel e nas seguintes os diversos custos, créditos, impostos e financiamento.
Somente nas caixas 300 e 600 é que temos o valor total a ser pago/recebido.
Exemplo
Vamos calcular a rentabilidade de um investimento em um imóvel com preço de USD 500 mil.
Existem diversas variáveis que devemos levar em consideração para calcular o retorno do investimento. Vamos começar pela receita com aluguel.
Os três fatores para o cálculo da receita que o imóvel irá gerar são:
- preço da diária
- taxa de ocupação
- administração do imóvel (property management)
O último item é bem importante e não há como fugir dele. Você precisará de alguém para preparar o imóvel para receber os hóspedes, fazer manutenção, ajudar com problemas inesperados, atender ligações de madrugada, etc. E, claro, esse preço varia bastante. Então, um imóvel cuja diária de locação é USD 400, ocupação de 60% e a taxa de administração corresponde a 10% da receita, terá a seguinte receita:
Se a taxa de ocupação fosse 70%:
Se a taxa de ocupação for 70%, mas a taxa de administração fosse 20%:
Você já deve ter percebido que uma pesquisa mais aprofundada sobre essas variáveis é essencial para saber se o investimento no imóvel vai trazer resultado. Por exemplo, a taxa de ocupação vai depender da região do imóvel. Também é necessário saber é possível fazer aluguel de curta duração, entre outros.
O próximo passo é saber quanto de dinheiro você vai precisar colocar no imóvel.
Nesse item também temos diversas variáveis que influenciam no resultado final. Vamos começar pelas despesas:
- despesas com o closing (coisas burocráticas, taxas, etc.)
- há crédito para o closing?
- despesas adicionais
- formação de empresa nos EUA
Depois disso temos o financiamento:
- percentual do imóvel a ser financiado
- taxa de juros do financiamento
- prazo
O primeiro item é bastante importante. Nem sempre o percentual a ser financiado é o memo que você quer. Além disso, o banco que irá fazer o financiamento contrata alguém para avaliar o imóvel e, muitas vezes, esse valor é abaixo do valor da transação. Assim, o empréstimo será menor que o projetado. Por isso, é sempre bom estar preparado para ter que colocar mais dinheiro a vista que o esperado.
Voltando ao exemplo. Digamos que as despesas de closing custem 3% do valor do imóvel, que não há crédito de closing nem despesas adicionais e o custo para a formação da empresa nos EUA seja USD 1.500. Para o financiamento, teremos juros de 5%, prazo de 30 anos e financiaremos 50% do valor do imóvel. O resultado disso tudo seria o seguinte:
Note que o imóvel que você comprou por USD 500 mil, na verdade te custará USD 516 mil (pouca gente leva em consideração esses custos adicionais).
Mas como o financiamento será metade do seu valor, você terá que desembolsar USD 266.500. Apesar de desembolsar menos, você já tem um custo mensal: a parcela de USD 1,342.05 do financiamento.
Mas, calma! ainda temos outras despesas. Temos que lembrar do seguro e property tax todo ano e da taxa de condomínio todo mês:
Uma rápida conta nos dá um custo anual do imóvel de USD 34 mil!
Note que o custo anual é menor que os cenários de renda que traçamos. Isso quer dizer que, você não precisará colocar dinheiro todo ano na conta da empresa que é dona do imóvel para pagar as despesas – o que pode ocorrer algumas vezes.
Bom, sabemos que o fluxo de caixa é positivo, mas o retorno do investimento é bom?
Como em qualquer projeção, temos que trabalhar em cima de algumas variáveis para ter uma ideia da atratividade. O resultado real só saberemos quando a venda realmente acontecer.
Mas digamos que o imóvel foi comprado em janeiro de 2018 e na nossa análise, o venderemos em dezembro de 2027. Ainda, projetamos uma valorização anual de 3% (esse número não é aleatório). Assim, o valor de venda (descontando a comissão) será de USD 630 mil:
Lembre-se: você não vai receber esse dinheiro. Como o imóvel foi financiado você terá que pagar o valor do principal em dezembro de 2027 ao banco (USD 206 mil), ficando com a diferença.
O fluxo de caixa anual (usando 70% de taxa de ocupação e 20% de property management) disso tudo é o seguinte:
Em resumo, no primeiro ano haverá um desembolso e nos anos seguintes o fluxo de caixa é positivo. Mas isso ainda não nos diz se é um bom investimento. Calculando a taxa interna de retorno, chegamos a:
Nada que chame a atenção, mas temos que lembrar que é um retorno em dólares – então, não é de se jogar fora!
Como qualquer investimento você precisa saber como ele se encaixa em sua estratégia. Depois disso, fazer a análise para saber se o risco é condizente com a rentabilidade esperada e rodar algumas simulações mudando variáveis como receita e valorização do imóvel para se preparar para cenários adversos. E lembre-se: a planilha aceita tudo!