A carta aos acionistas da Berkshire Hathaway foi divulgada no último sábado (25/02) e, como sempre, não desapontou. Ela começa com a rentabilidade histórica (medida pelo valor patrimonial e pelo preço das ações) comparada ao retorno do S&P 500 desde 1965. Nesses 52 anos de retorno, o resultado acumulado foi o seguinte (não se assuste):
- valor patrimonial: 884.319%
- preço da ação: 1.972.595%
- S&P 500: 12.717%
Em números mais fáceis de serem entendidos, se você tivesse comprado USD 1.000 em ações da empresa no início de 1965 teria, ao final de 2016:valor patrimonial:
- USD 8.844.190
- preço da ação: USD 19.726.950
- S&P 500: USD 128.170
Certamente, um belo investimento.
Em diversos Planos de Voo (muitos mesmo), eu escrevi que uma das chaves para se ter uma estratégia bem sucedida é paciência e tempo. Esses resultados foram conquistados ao longo de décadas, com anos bons e ruins – por exemplo, em 1999, o S&P 500 subiu 21% e as ações da Berkshire caíram 19,9%.
O tempo é essencial para que o resultado apareça. Pelo números acima, qualquer um pensaria que os retornos anualizados do valor patrimonial e o preço da ação seriam bem distantes um do outro. Mas isso está longe de ser verdade:
- valor patrimonial: 19,0%
- preço da ação: 20,8%
- S&P 500: 9,7%
Veja que uma rentabilidade pouco menor que 2% ao ano, ao longo de 52 anos, foi responsável por uma diferença de mais de um MI-LHÃO de pontos percentuais!
Repetindo: tempo e paciência.
Voltando à carta…
Buffett relembra alguns erros, empresas que ele comprou usando ações da Berkshire, e conclui que aprendeu a lição: compras somente em dinheiro. Depois, em uma tabela, ele mostra como, desde 1999, a Berkshire passou de uma empresa de investimentos para uma operacional (isto é, a maior parte do lucro vem de suas subsidiárias e não do retorno do mercado de ações):
Ele continua com um texto exaltando a economia norte-americana, dizendo que as conquistas do país se resumem a uma palavra: milagre. Ele aproveita para dar uma alfinetada no governo Trump dizendo que isso só foi possível com imigrantes talentosos e ambiciosos (além da ingenuidade humana, um sistema de mercado e um estado de direito forte).
A seção seguinte é dedicada a recompra de ações. Este tema virou uma grande polêmica nos EUA nos últimos anos. Isso porque as empresas aumentaram (e muito!) a recompra de suas ações com o dinheiro barato causado por juros extremamente baixos. Muitos veem isso como algo anti-patriótico, já que essas empresas deveriam investir em seu crescimento e gerar empregos.
Buffett diz que o problema é quando as recompras são feitas a qualquer preço e acabam sendo prejudiciais aos acionistas e relembra a regra para recompras da Berkshire (talvez a única empresa do mundo com algo assim): recompras só serão feitas se o preço das ações ficar abaixo de 120% do seu valor patrimonial.
Sua sugestão para evitar recompras exageradas: fazer com que o conselho da empresa, antes de iniciar a discussão, dê as mãos e repita em uníssono: “O que é inteligente em um preço é estúpido em outro.”
Em seguida, ele começa a discussão pelos grupos da empresa: seguros (com a tradicional propaganda da GEICO); empresas reguladas (de eletricidade e linhas férreas); e manufatura, serviços e varejo.
Na parte de seguros, ele volta a exaltar o CEO da Berkshire Hathaway Reinsurance Group, Ajit Jain. Ajit está na empresa desde 1986 e é apontado como sucesso de Buffett como CEO da Berkshire Hathaway – lembrando que há alguns anos ele contratou dois gestores para cuidar dos investimentos de mercado da empresa: Todd Combs e Ted Weschler (cada um responsável por mais de USD 10 bilhões). Os maiores investimentos são:
A parte de investimentos, aliás, trazia grande expectativa. Afinal, depois de passar décadas falando mal da indústria de aviação, ele decidiu investir nas quatro grandes dos EUA: Delta, Southwest, United e American Airlines. Além disso, ele não investia em empresas de tecnologia pois não entendia como eles funcionavam. Ao final de 2016, sua segunda maior posição era em Apple (em entrevistas essa semana, ele disse que o investimento na Apple já chegou a quase USD 20 bilhões depois dele levar seus bisnetos e amigos ao Dairy Queen e perceber como todos tinham iPhone e dizerem que o trocariam somente por um novo iPhone). Mas, infelizmente, ele não escreveu nada sobre o assunto.
Ele continua a carta falando um pouco de impostos e chega a aposta. No início de 2006 (na carta de 2005), ele disse que as grandes taxas de administração cobradas por fundos tornaria praticamente impossível vencer um investidor que fizesse nada. Depois, ele disse que apostaria USD 500 mil que nenhum investidor profissional conseguiria escolher ao menos cinco hedge funds para bater um fundo de índice da Vanguard que seguisse o S&P 500.
Pois bem, alguém (Ted Seides, da Protégé Partners) aceitou a aposta e colocou seus USD 500 mil. Cada um escolheu uma instituição de caridade, que receberá o dinheiro caso seu lado da aposta seja o vencedor. A performance dos fundos começou em 2008; portanto, estamos no último ano da aposta e Buffett já se declarou vencedor. O motivo é fácil de entender:
Antes de dar os detalhes da reunião de acionistas (com direito a descontos, corrida, desafio de tênis de mesa, entre outros, durante o primeiro final de semana de maio), ele termina falando que sempre recebe pedidos de dicas de investimento.
Ele quase sempre recomenda o fundo de índice da Vanguard (cujo custo anual é de 0,05% ao ano). Ele disse que as pessoas com menos dinheiro geralmente a seguem. Porém, nenhum investidor rico, instituição ou fundo de pensão dá ouvidos a ele.
Segundo ele, os profissionais que dão conselhos às instituições e fundos de pensão não conseguiriam cobrar suas taxas se ano após ano dissessem somente para comprar o fundo de índice barato. Já os ricos acham que o seu dinheiro consegue comprar a melhor comida, casa, escola etc. Assim, eles não acreditam que um produto que esteja disponível para as massas consiga ser realmente o melhor e preferem ir atrás dos gestor do momento e pagar altas taxas por fundos que não lhes trarão resultados.
Esse é um resumo, bem resumido, do que foi escrito. Se você gosta desse tipo de leitura, recomendo ler todo o conteúdo.
Originalmente enviado aos clientes da Inva Capital em 03/03/2017.